Uma reflexão sobre a tragédia do avião da TAM

Por FC Leite Filho

As análises sobre o acidente de ontem do Airbus A-320 da TAM, que se chocou contra um depósito da própria companhia, o TAM Express, no Aeroporto de Congonhas, em São Paulo, matando pelo menos 200 pessoas, são quase unânimes em apontar o Governo Federal e, mais especificamente, o presidente Lula como o grande culpado. 

Ninguém fala da irresponsabilidade da empresa, useira e vezeira em praticar o chamado overbook (venda em excesso de passagens), que autorizou a decolagem do vôo com 16 passageiros a mais, ou seja, com excesso de peso.
Ninguém tampouco se refere à multiplicação desordenada das novas companhias aéreas, muitas delas sem a menor tradição no ramo, que desorganizaram a grade dos vôos, vendendo passagens abaixo do custo e provocando tumulto e descontrole no atendimento aos passageiros. Nenhum veículo de comunicação, finalmente, mencionou o veto das aéreas, certamente porque diminuiriam seus lucros estupendos, à proposta do governo de reescalonar os vôos para que sejam evitados os horários de pico.

Por que as empresas, sobretudo as multinacionais e as de grande porte, são sempre preservadas, e muitas vezes, até inocentadas, como vem ocorrendo no chamado apagão aéreo? É porque elas são grandes anunciantes nos jornais, na televisão, no rádio, na internet? É por que elas têm interesses próximos aos dos barões da mídia? Ou é porque elas são também fiadoras da política neoliberal que quer forçar a privatização dos nossos modernos e sofisticados aeroportos? 

Está certo que para elas, a privatização dos aeroportos é um negócio da China. Certamente, as grandes empresas, multinacionais, inclusive, que estão de olho nos nossos aeroportos querem ser beneficiadas pelo mesmo modelo de privatizações deflagrado no Governo Fernando Henrique Cardoso, o FHC. Nós sabemos como foi o queima das estatais da energia, das telecomunicações, dos transportes, das rodovias, do aço, que torraram as nossas estatais ao preço de banana, em negociatas com empresas, algumas de fachada, que ainda receberam financiamentos do BNDEs, a juros mínimos e a prazos a perder de vista. 

Tais questões são relevantes para a análise, não há dúvida. Mas a questão de fundo não é esta. O grande nó da questão é a nossa matriz de transportes. O Brasil está no limite dos limites do uso do seu transporte aéreo e rodoviário. A não abordagem pela mídia desta questão é outra coisa difícil de entender.

Qual foi o cristão freqüentador de Congonhas que não anteviu que uma ou dez tragédias podem ocorrer a qualquer momento naquele aeroporto supercongestionado (só tem capacidade para 12 milhões de passageiros/ano, mas opera com 18 milhões, uma média de 600 aterrissagens e decolagens por dia) encravado no meio da grande cidade de São Paulo? Fala-se na criação de mais aeroportos, o que seria um outro desperdício, porque não iria resolver o problema do transporte naquela área extremamente vital para a economia, que é o centro-sul. 

A saída, todo mundo está cansado de saber, é o incremento das ferrovias, a começar pela implantação do Trem de Alta Velocidade (TAV), o chamado trem-bala, entre as cidades de São Paulo e do Rio de Janeiro, onde está o fulcro dos negócios. Mas ninguém se mexe e aqui eu concordo em botar a culpa no Governo e no próprio presidente Lula. Por que esse projeto, que dorme há mais de 20 anos nas estantes, não é executado?

Parece que o receio do Governo é quanto ao custo da obra, que sairia entre nove e 12 bilhões de dólares. Esta obra só seria possível se houvesse financiamento quase completo da iniciativa privada. Ora, este é um raciocínio primário, porque todo mundo sabe que os empresários, do Brasil e do mundo, jamais se aventuram numa obra destas proporções. Não foi assim com a Ponte Rio-Niterói, uma obra até mais complexa, feita quase toda com financiamento direto do Governo Federal. Não foi assim com o metrô das nossas cidades? E alguém tem dúvida de que JK construiria Brasília se fosse esperar a boa vontade dos empresários ou mesmo das novas PPPs, Parcerias Público-Privadas?

A meu ver, está faltando coragem e discernimento ao presidente Lula e todo o seu Governo para tomar a peito a questão e realizar esta obra que não é lá tão ciclóptica. A França acaba de interligar todo o seu território com o TGV (Trem de Grande Velocidade), uma tecnologia que agora está exportando para o mundo. A Rússia não deixa por menos e constrói uma média de dois mil quilômetros, por ano, de linhas para o trem-bala. Por que não podemos partir para este tipo de decisão? Quem sabe se com isto, a mídia mudasse o seu enfoque nos escândalos e passasse a debater questões mais relevantes do que noticiário policial?


Veja também:

Lista corrigida de passageiros e tripulantes 

Motim no apagão: Quiseram derrubar o Lula 

Aereocaos

    

Por FC Leite Filho

As análises sobre o acidente de ontem do Airbus A-320 da TAM, que se chocou contra um depósito da própria companhia, o TAM Express, no Aeroporto de Congonhas, em São Paulo, matando pelo menos 200 pessoas, são quase unânimes em apontar o Governo Federal e, mais especificamente, o presidente Lula como o grande culpado. 

Ninguém fala da irresponsabilidade da empresa, useira e vezeira em praticar o chamado overbook (venda em excesso de passagens), que autorizou a decolagem do vôo com 16 passageiros a mais, ou seja, com excesso de peso.
Ninguém tampouco se refere à multiplicação desordenada das novas companhias aéreas, muitas delas sem a menor tradição no ramo, que desorganizaram a grade dos vôos, vendendo passagens abaixo do custo e provocando tumulto e descontrole no atendimento aos passageiros. Nenhum veículo de comunicação, finalmente, mencionou o veto das aéreas, certamente porque diminuiriam seus lucros estupendos, à proposta do governo de reescalonar os vôos para que sejam evitados os horários de pico.

Por que as empresas, sobretudo as multinacionais e as de grande porte, são sempre preservadas, e muitas vezes, até inocentadas, como vem ocorrendo no chamado apagão aéreo? É porque elas são grandes anunciantes nos jornais, na televisão, no rádio, na internet? É por que elas têm interesses próximos aos dos barões da mídia? Ou é porque elas são também fiadoras da política neoliberal que quer forçar a privatização dos nossos modernos e sofisticados aeroportos? 

Está certo que para elas, a privatização dos aeroportos é um negócio da China. Certamente, as grandes empresas, multinacionais, inclusive, que estão de olho nos nossos aeroportos querem ser beneficiadas pelo mesmo modelo de privatizações deflagrado no Governo Fernando Henrique Cardoso, o FHC. Nós sabemos como foi o queima das estatais da energia, das telecomunicações, dos transportes, das rodovias, do aço, que torraram as nossas estatais ao preço de banana, em negociatas com empresas, algumas de fachada, que ainda receberam financiamentos do BNDEs, a juros mínimos e a prazos a perder de vista. 

Tais questões são relevantes para a análise, não há dúvida. Mas a questão de fundo não é esta. O grande nó da questão é a nossa matriz de transportes. O Brasil está no limite dos limites do uso do seu transporte aéreo e rodoviário. A não abordagem pela mídia desta questão é outra coisa difícil de entender.

Qual foi o cristão freqüentador de Congonhas que não anteviu que uma ou dez tragédias podem ocorrer a qualquer momento naquele aeroporto supercongestionado (só tem capacidade para 12 milhões de passageiros/ano, mas opera com 18 milhões, uma média de 600 aterrissagens e decolagens por dia) encravado no meio da grande cidade de São Paulo? Fala-se na criação de mais aeroportos, o que seria um outro desperdício, porque não iria resolver o problema do transporte naquela área extremamente vital para a economia, que é o centro-sul. 

A saída, todo mundo está cansado de saber, é o incremento das ferrovias, a começar pela implantação do Trem de Alta Velocidade (TAV), o chamado trem-bala, entre as cidades de São Paulo e do Rio de Janeiro, onde está o fulcro dos negócios. Mas ninguém se mexe e aqui eu concordo em botar a culpa no Governo e no próprio presidente Lula. Por que esse projeto, que dorme há mais de 20 anos nas estantes, não é executado?

Parece que o receio do Governo é quanto ao custo da obra, que sairia entre nove e 12 bilhões de dólares. Esta obra só seria possível se houvesse financiamento quase completo da iniciativa privada. Ora, este é um raciocínio primário, porque todo mundo sabe que os empresários, do Brasil e do mundo, jamais se aventuram numa obra destas proporções. Não foi assim com a Ponte Rio-Niterói, uma obra até mais complexa, feita quase toda com financiamento direto do Governo Federal. Não foi assim com o metrô das nossas cidades? E alguém tem dúvida de que JK construiria Brasília se fosse esperar a boa vontade dos empresários ou mesmo das novas PPPs, Parcerias Público-Privadas?

A meu ver, está faltando coragem e discernimento ao presidente Lula e todo o seu Governo para tomar a peito a questão e realizar esta obra que não é lá tão ciclóptica. A França acaba de interligar todo o seu território com o TGV (Trem de Grande Velocidade), uma tecnologia que agora está exportando para o mundo. A Rússia não deixa por menos e constrói uma média de dois mil quilômetros, por ano, de linhas para o trem-bala. Por que não podemos partir para este tipo de decisão? Quem sabe se com isto, a mídia mudasse o seu enfoque nos escândalos e passasse a debater questões mais relevantes do que noticiário policial?


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