“Spreads”: de quem é a acomodação?

Cremos que a acomodação à qual eles se referem não é dos bancos, mas dos gestores das políticas macroeconômicas vigentes

ESTA FOLHA publicou, no dia 4/ 11, artigo intitulado "Uma dívida do sistema bancário com o Brasil", de autoria dos deputados federais do PT Cláudio Vignatti (SC), Pedro Eugênio (PE) e Ricardo Berzoini (SP).
No artigo, eles afirmam que "os "spreads" bancários cobrados pelos bancos têm sido um dos fatores limitantes do crescimento do nosso país".
Citam estudo do Ipea sobre as transformações recentes na indústria bancária e relacionam as medidas adotadas pelo governo para viabilizar a ampliação da oferta de crédito. Por fim, revelam a tramitação do projeto de lei nº 5.258/09, que estabelece um sistema de metas para a margem bancária.
O que faltou ser esclarecido pelos parlamentares foram os motivos pelos quais os bancos atuaram nos últimos 15 anos com tanta desenvoltura sem ter, dos bancos públicos, do Banco Central ou do Ministério da Fazenda, nenhum tipo de contrapeso nos "spreads" que esses bancos cobram e na aplicação dos compulsórios que receberam do Banco Central na crise.
Cremos que a acomodação à qual se referem os autores não é dos bancos, mas dos gestores das políticas macroeconômicas vigentes.
O impacto dos "spreads" bancários como fator limitante do desenvolvimento, convenhamos, é brando se comparado com o comprometimento que se impõe ao Tesouro Nacional com os serviços e as amortizações da dívida pública, sem nenhum discernimento sobre a natureza dessa dívida.
Vale registrar outro estudo do Ipea, de 12/11/08, que revela a desigualdade na partição da riqueza nacional entre os ganhos com o trabalho e os com a propriedade. Segundo o estudo, o país pagou R$ 1,267 trilhão de juros da dívida pública e apenas gastos federais de R$ 98 bilhões em investimentos, desembolsando ainda R$ 315 bilhões em saúde e R$ 149 bilhões em educação (comunicado 14 do Ipea).
Por esses números, vale tudo para arrancar do Tesouro -aliás, da sociedade- a multiplicação de ativos aplicados em títulos da dívida mobiliária, assunto que continua coberto por um manto dogmático, barreira intransponível para que se possa tratar da dívida e do endividamento de maneira soberana.
Ora, como fazê-lo se as autoridades fazendárias e monetárias não exercem suas responsabilidades? O Banco Central vem praticando políticas monetárias e cambiais que se contentam com a estabilidade da moeda, dando as costas ao emprego e ao crescimento econômico.
Os autores do artigo citado se esqueceram de explicar as razões pelas quais o governo liberou compulsórios sem vincular sua aplicação ao crédito.
Sem esse "porém", os bancos aplicaram essas disponibilidades em títulos da dívida mobiliária, num autêntico drible às boas intenções do BC.
Quanto à indexação da Selic aos títulos, não são os bancos que estabelecem esse atrelamento. É o Tesouro Nacional que mantém essa indexação. Por que eles não explicam isso?
Bancos nacionais, alguns deles públicos, mantêm R$ 380 bilhões aplicados em títulos da dívida mobiliária, parte de suas próprias carteiras, e não de terceiros, segundo exposto pelo secretário nacional do Tesouro, Arno Augustin, na CPI da Dívida Pública.
Essa liberalidade, concedida pelas autoridades do Tesouro, estimula o negócio com a dívida mobiliária "selicada" e afronta os objetivos previstos para o sistema financeiro nacional no artigo 192 da Constituição Federal, segundo a qual ele deve estar "estruturado de forma a promover o desenvolvimento equilibrado do país e a servir aos interesses da coletividade".
Quem estabelece taxas atraentes? Quem sustenta a relação trinomial entre política fiscal, monetária e cambial, senão a dupla Tesouro Nacional e Banco Central? De qual governo?
Nem parece que um dos autores do artigo é presidente nacional do PT, opositor de muitas dessas medidas na era FHC.
Bancos não são instituições autonomizadas. Devem seguir diretrizes gerais que associem o crédito à produção e ao investimento, indo na direção do pleno emprego.
Onde está a autoridade fazendária que não submete os Bancos do Brasil e Caixa a uma agressiva política de competição em torno dos "spreads"?
Com sua capacidade de alavancar crédito, duvidamos que essa atitude não forçaria os bancos privados a mudar de estratégia.
A sociedade espera que as autoridades econômicas e monetárias assumam suas tarefas constitucionais e decidam pela convergência entre políticas de crédito e desenvolvimento.

PAULO RUBEM SANTIAGO , deputado federal pelo PDT-PE, é vice-líder do seu partido e titular da CPI da Dívida Pública.

Cremos que a acomodação à qual eles se referem não é dos bancos, mas dos gestores das políticas macroeconômicas vigentes

ESTA FOLHA publicou, no dia 4/ 11, artigo intitulado “Uma dívida do sistema bancário com o Brasil”, de autoria dos deputados federais do PT Cláudio Vignatti (SC), Pedro Eugênio (PE) e Ricardo Berzoini (SP).
No artigo, eles afirmam que “os “spreads” bancários cobrados pelos bancos têm sido um dos fatores limitantes do crescimento do nosso país”.
Citam estudo do Ipea sobre as transformações recentes na indústria bancária e relacionam as medidas adotadas pelo governo para viabilizar a ampliação da oferta de crédito. Por fim, revelam a tramitação do projeto de lei nº 5.258/09, que estabelece um sistema de metas para a margem bancária.
O que faltou ser esclarecido pelos parlamentares foram os motivos pelos quais os bancos atuaram nos últimos 15 anos com tanta desenvoltura sem ter, dos bancos públicos, do Banco Central ou do Ministério da Fazenda, nenhum tipo de contrapeso nos “spreads” que esses bancos cobram e na aplicação dos compulsórios que receberam do Banco Central na crise.
Cremos que a acomodação à qual se referem os autores não é dos bancos, mas dos gestores das políticas macroeconômicas vigentes.
O impacto dos “spreads” bancários como fator limitante do desenvolvimento, convenhamos, é brando se comparado com o comprometimento que se impõe ao Tesouro Nacional com os serviços e as amortizações da dívida pública, sem nenhum discernimento sobre a natureza dessa dívida.
Vale registrar outro estudo do Ipea, de 12/11/08, que revela a desigualdade na partição da riqueza nacional entre os ganhos com o trabalho e os com a propriedade. Segundo o estudo, o país pagou R$ 1,267 trilhão de juros da dívida pública e apenas gastos federais de R$ 98 bilhões em investimentos, desembolsando ainda R$ 315 bilhões em saúde e R$ 149 bilhões em educação (comunicado 14 do Ipea).
Por esses números, vale tudo para arrancar do Tesouro -aliás, da sociedade- a multiplicação de ativos aplicados em títulos da dívida mobiliária, assunto que continua coberto por um manto dogmático, barreira intransponível para que se possa tratar da dívida e do endividamento de maneira soberana.
Ora, como fazê-lo se as autoridades fazendárias e monetárias não exercem suas responsabilidades? O Banco Central vem praticando políticas monetárias e cambiais que se contentam com a estabilidade da moeda, dando as costas ao emprego e ao crescimento econômico.
Os autores do artigo citado se esqueceram de explicar as razões pelas quais o governo liberou compulsórios sem vincular sua aplicação ao crédito.
Sem esse “porém”, os bancos aplicaram essas disponibilidades em títulos da dívida mobiliária, num autêntico drible às boas intenções do BC.
Quanto à indexação da Selic aos títulos, não são os bancos que estabelecem esse atrelamento. É o Tesouro Nacional que mantém essa indexação. Por que eles não explicam isso?
Bancos nacionais, alguns deles públicos, mantêm R$ 380 bilhões aplicados em títulos da dívida mobiliária, parte de suas próprias carteiras, e não de terceiros, segundo exposto pelo secretário nacional do Tesouro, Arno Augustin, na CPI da Dívida Pública.
Essa liberalidade, concedida pelas autoridades do Tesouro, estimula o negócio com a dívida mobiliária “selicada” e afronta os objetivos previstos para o sistema financeiro nacional no artigo 192 da Constituição Federal, segundo a qual ele deve estar “estruturado de forma a promover o desenvolvimento equilibrado do país e a servir aos interesses da coletividade”.
Quem estabelece taxas atraentes? Quem sustenta a relação trinomial entre política fiscal, monetária e cambial, senão a dupla Tesouro Nacional e Banco Central? De qual governo?
Nem parece que um dos autores do artigo é presidente nacional do PT, opositor de muitas dessas medidas na era FHC.
Bancos não são instituições autonomizadas. Devem seguir diretrizes gerais que associem o crédito à produção e ao investimento, indo na direção do pleno emprego.
Onde está a autoridade fazendária que não submete os Bancos do Brasil e Caixa a uma agressiva política de competição em torno dos “spreads”?
Com sua capacidade de alavancar crédito, duvidamos que essa atitude não forçaria os bancos privados a mudar de estratégia.
A sociedade espera que as autoridades econômicas e monetárias assumam suas tarefas constitucionais e decidam pela convergência entre políticas de crédito e desenvolvimento.

PAULO RUBEM SANTIAGO , deputado federal pelo PDT-PE, é vice-líder do seu partido e titular da CPI da Dívida Pública.