Seguir o exemplo de Portugal

Foto: Miguel Baltazar

Por Rodrigo Neves
09/03/2021

É preciso unir o País, ouvir a Ciência, aproveitar a retomada do auxílio emergencial entendendo-o também como medida sanitária, convocando os brasileiros ao lockdown por algumas semanas e evitar a devastação final do Brasil

 No início de janeiro, a convite do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra, iniciei pesquisa acadêmica sobre pandemia e cidades e o futuro da democracia. Queria entender melhor as razões do êxito de Portugal no combate à Covid-19 e o bem sucedido modelo político da geringonça, uma coalizão de centro-esquerda e esquerda que coabita com um presidente conservador de centro direita, que governa o país desde 2015 com estabilidade política, crescimento econômico maior do que a Europa e a retomada no século XXI de um Estado de em-estar Social.

Para minha surpresa, naqueles dias iniciais de janeiro, Portugal estava passando pela pior situação na pandemia com recordes diários de óbitos e novos casos do país em função da nova variante britânica, do inverno mais rigoroso, das aglomerações excessivas de Natal e Ano Novo decorrentes da autoconfiança com o êxito na primeira onda e relaxamento dos cidadãos nas medidas de prevenção com o início da vacinação em dezembro.

A situação era dramática a ponto de pacientes graves do continente terem que ser levados para atendimento nas ilhas da Madeira e Açores, pois os hospitais estavam com quase 100% de ocupação dos leitos.

Foi então que assisti o pronunciamento histórico do presidente da República afirmando que “nenhuma das negações resolve as esperas infindáveis, o sufoco das unidades intensivas, o sofrimento dos doentes. Temos de ser mais firmes no que fizemos. Sabemos que o custo de medidas mais duras é inferior ao custo de uma sociedade destruída por uma pandemia”. Junto com o primeiro-ministro, de centro-esquerda, convocaram os portugueses ao lockdown diante do “período mais difícil da pandemia”.

Após algumas semanas de rigoroso confinamento, todos indicadores epidemiológicos apontam para a retomada do controle da situação em Portugal, com menos casos novos, cerca de 45 óbitos-dia, e menos de 35% de ocupação dos leitos. Com o Plano de Reestruturação e Resiliência começam a debater a execução de expressivos investimentos em energias renováveis, transição digital, Saúde, transporte e habitação, para a retomada do pós pandemia, pois como diz o sociólogo português Boaventura de Sousa Santos “o novo século começa agora”.

Diante, infelizmente, da previsível tragédia humanitária e sanitária do Brasil com recordes diários de mortos e explosão das UTIs nas cidades, é fundamental seguir o exemplo de Portugal. Unir o país, ouvir a Ciência, aproveitar a retomada do auxílio emergencial entendendo-o também como medida sanitária, convocando os brasileiros ao lockdown por algumas semanas e evitar a devastação final do Brasil.

Em “Raízes do Brasil”, Sérgio Buarque de Holanda problematiza com o homem cordial a colonização portuguesa. Hoje os portugueses descobriram o caminho para enfrentar a pandemia e é preciso seguir Portugal.

*Rodrigo Neves é sociólogo e ex-prefeito de Niterói (RJ) pelo PDT.