Quatro motivos para lembrar por que o governo militar foi a pior experiência da República brasileira


Da redação
31/03/2021

“O povo que não conhece o seu passado está fadado a repeti-lo”, disse o pensador irlandês Edmund Burke, no século XVIII. O pensamento secular parece se materializar no Brasil atual. Hoje, 31 de março, completam 57 anos do golpe civil-militar que depôs o presidente João Goulart e promoveu a maior e mais cruel ditadura no país. Apesar das mazelas impostas pelo regime ao longo de 21 anos, o país vive novamente a experiência de um governo com viés autoritário.

É certo que as instituições democráticas impedem que o presidente da República, Jair Bolsonaro, se torne um ditador, mas este flerta perigosamente com o autoritarismo em suas atribuições e é legitimado por uma pequena e feroz parcela da população. Atacam a imprensa, as liberdades individuais, o Congresso e o Supremo Tribunal Federal (STF). O provável é que essa força política desidrate ao longo do tempo, mas enquanto vigora provoca retrocessos no país.

Mas afinal, como impedir que novos aspirantes a ditador cheguem às esferas de poder? Voltando a afirmação de Edmund Burke, é preciso difundir o conhecimento acerca da história nacional. Por isso, nesta data emblemática, relembre quatro motivos que fizeram da ditadura militar o pior regime estabelecido no Brasil.

1º – Ausência de direitos humanos: A ditadura militar cometeu crimes contra a humanidade. A violência e a repressão eram política de estado. O regime iniciado em 1964 prendeu, torturou e matou opositores. Existia, inclusive, um manual de tortura para extrair informações, o qual incluía afogamento, choque, pau-de-arara, estupro e asfixia – práticas já defendidas publicamente pelo atual presidente da República.

A Comissão Nacional da Verdade reconheceu a morte e o desaparecimento de 434 pessoas. Já a organização internacional não governamental de direitos humanos, a Human Rights Watch, aponta que aproximadamente 20 mil pessoas foram torturadas pelo governo militar brasileiro. Quem era considerado inimigo do estado, não gozava de nenhum direito.

2º – Censura e perseguição: Não havia liberdade de expressão ou de imprensa. Artistas, intelectuais e jornalistas eram vigiados pelo Conselho Superior de Censura. Se burlassem as regras – de cunho político e moral – eram encaminhados para o Tribunal de Censura. De lá poderiam ser presos, torturados ou até mortos, como aconteceu com o jornalista Vladimir Herzog em 1975.

O governo ditatorial fechou e depredou jornais como o “Ultima Hora”, “Folha da Semana” e “O Semanário”. O ataque aos veículos de imprensa era constante, ato que o atual governo tenta imitar dentro de suas limitações. Os militares também cassaram o direito político de muita gente. Por vezes a perseguição terminava em exílio, como no caso de Leonel Brizola, João Goulart e Caetano Veloso.

3º – Desigualdade social: Durante a ditadura, o Brasil ampliou e muito a desigualdade entre as diferentes camadas sociais. A distribuição de renda se tornou mais polarizada: os 10% mais ricos que tinham 38% da renda em 1960, chegaram a 51% em 1980. Já os mais pobres, que tinham 17% da renda nacional em 1960, decaíram para 12% duas décadas depois.

É fato que entre 1968 e 1973 o país cresceu acima de 10% ao ano, o chamado “milagre econômico”. No entanto, tal crescimento representou a miséria para a maioria dos brasileiros. Em 1974, o poder de comprar do salário mínimo representava a metade do que era em 1960.

Hoje, o governo Bolsonaro também promove desigualdade e põe milhões de brasileiros na miséria. A diferença é que agora a economia decresce: em plena pandemia, os 10% mais ricos perderam 3% da sua renda, enquanto os 40% mais pobres viram 30% dos rendimentos desaparecer. Isso sem falar nos 14 milhões sem emprego e sem renda.

4º – Corrupção: O discurso anticorrupção envergado pelos golpistas em 1964, como no atual governo, era apenas falácia. Na prática, os militares praticavam superfaturamento, desvio de verba, tráfico de influência e outros ilícitos. Tudo acobertado pelo autoritarismo, a falta de transparência e a censura sistemática.

Não havia conselhos de fiscalização, o Congresso Nacional fora dissolvido e a sociedade civil organizada praticamente não existia – ao menos não como fiscal do governo. Naturalmente, as contas públicas nunca eram analisadas e o erário se perdia em “tenebrosas transações”, inclusive com empreiteiras que se tornaram grandes nesta época, a exemplo da Odebrecht.

Jair Bolsonaro é dessa mesma escola, tenta usar o poder e a força para encobrir casos de corrupção, principalmente os ligados a ele e a sua família. Não por acaso, foi escolhido como a “Pessoa do Ano no Crime Organizado e Corrupção” de 2020, pelo consórcio internacional Projeto de Divulgação de Crimes Organizados e Corrupção (OCCRP, na sigla em inglês), formado por organizações da imprensa independente e jornalistas investigativos.