Por que o golpe de Estado no Brasil deve falhar

O líder notoriamente corrupto da câmara baixa do Parlamento Brasileiro, Eduardo Cunha — titular de 11 contas suíças ilegais, indicado na documentação do Panamá e indiciado no Supremo Tribunal Federal — tem agendada uma votação em plenário crucial sobre a possibilidade de impeachment da presidente Dilma Rousseff para este próximo domingo. Domingo, tradicionalmente, é o dia em que a esmagadora maioria dos brasileiros relaxa assistindo a futebol na TV. Cunha também tentou definir as regras do jogo; a chamada iria começar com os estados do sul mais ricos, que são mais favoráveis ao impeachment – um eufemismo para a mudança de golpe, o culminar da estratégia de guerra híbrido suave implantado desde o início pelos suspeitos sempre aliados com a oligarquia, as elites brasileiras. Este procedimento de votação agora mudou – irá alternar estados do norte e do sul – para criar uma onda no plenário da Câmara no sentido de impeachment, permitindo assim a entrada gloriosa de outro bandido, o atual vice-presidente Michel Temer. De qualquer forma, a magnífica peça da dupla deve produzir Temer como presidente e Cunha como vice. A corrida em direção à farsa de domingo foi monopolizada pela mídia mainstream, controlada por quatro famílias, pretendendo criar uma inevitabilidade do impeachment. E, no entanto, todas as apostas estão fora. A oposição à Rousseff, cada vez mais desesperada, não arregimentou todos os dois terços necessários dos traidores no momento da votação na Câmara. A questão deve, então, ser encaminhada ao Senado. E a Suprema Corte também deve pronunciar-se sobre se Rousseff cometeu um “crime de responsabilidade”. Ela está sendo acusada de truques de contabilidade que supostamente deturpou o estatuto fiscal do governo, algo que todo presidente brasileiro tem feito, para não mencionar líderes em todo o mundo. Em paralelo, grandes vertentes da sociedade civil estão agora se mobilizando para garantir que o golpe será derrotado no Congresso e nas ruas. Esta saga não tem nada a ver com corrupção, supostamente o principal motivo. É tudo oportunismo político sujo. O plano do conspirador vice-presidente Michel Temer foi revelado através de um vazamento de áudio no noticiário noturno do império Globo. O ângulo era criar um clima positivo no sentido do impeachment, com Temer já atuando como presidente e posicionando-se como o portador pródigo (e facilitador) de boas notícias. Temer em seguida passou a ultrapassagem da mídia, afirmando que, sim, ele está qualificado para a presidência. Se o movimento de impeachment for derrotado, ele deve permanecer como vice-presidente. Ele insiste que não há golpe, enquanto abominando a possibilidade de uma nova eleição geral, porque isso representaria uma “ruptura constitucional”. Macbeth? Não, apenas um oportunista paroquial humilde. Então, onde está Lula em toda essa confusão? Gleen Greenwald conduziu uma extensa entrevista com o ex-ícone político presidente, onde ele defende o governo. Compare-o com a vista da cidade de Londres, para qual, é claro, isso não é um golpe. O que importa é o bem-estar dos “investidores estrangeiros”, como se o governo brasileiro tivesse a obrigação em primeiro lugar em relação a eles. Bem, é factível. Mesmo com Rousseff não acusada de qualquer delito, ao contrário do mote do Congresso farsa que quer derrubar seu governo. Dos 65 membros da comissão do Congresso farsa que votaram no impeachment, 35 dos 38 votos dos que votaram a favor estão sendo investigados por corrupção. A maior parte da sociedade civil, liderada por movimentos sociais e universidades e círculos de intelectuais, se posicionaram com força sobre o golpe. Com uma nuance crucial, eles estão atrás de Lula, pessoalmente, não o Partido dos Trabalhadores, que é de fato contaminado pela corrupção. Os grandes interesses industriais/bancários concentrados em São Paulo – estado mais rico do Brasil e superpotência econômica do país – apoiados pela maioria dos meios de comunicação agora mudam-se para o centro, com o lema “Não Dilma e nenhum Temer”, já concentrados nas eleições de 2018. No entanto, o que já aconteceu no tabuleiro de xadrez em constante evolução foi a dizimação dos ex-social-democratas, o PSDB. Esses comparsas de Wall Street/City of London só podem contar com a Lava Jato e as investigações relacionadas com o escândalo e a influência de CEOs de grandes empresas com sede em São Paulo. Seu santo padroeiro é o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, ex-desenvolvimentista social, “Príncipe dos Sociólogos”, que virou um mero paperboy das elites. Ele conseguiu alienar tanto os sociais-democratas quanto os direitistas estridentes. Sim, isso é tudo sobre as eleições de 2018, porque o impeachment significa, em poucas palavras, a reversão judicial através de um golpe branco do resultado de 2014, quando Dilma foi reeleita. No entanto, todas simulações recentes revelam que Lula ainda tem chance para 2018, embora sua percentagem de rejeição popular permaneça elevada. Por mais que emerja como o grande conciliador, estes números vão ser revertidos. O governo de Dilma, nos últimos dias, conseguiu organizar uma base um pouco minimalista capaz de impedir o impeachment, mas ainda incapaz de assegurar a governabilidade. Pelo menos o Supremo Tribunal agora parece estar finalmente inclinado a examinar os méritos jurídicos do processo de impeachment. O que é certo é que o império da Globo, no último trecho, vai torcer o voto no sentido do impeachment. É assim que o complexo judicial/mídia funciona. A Operação Lava Jato é o remix brasileiro da década de 1990 com a Operação Mãos Limpas da Itália. O juiz Gherardo Colombo, que fez parte da Operação Mãos Limpas, visitou o Brasil e explicou o que aconteceu a seguir: a investigação correu para baixo, porque o cidadão italiano médio ficou desmotivado com a divulgação de escândalo após escândalo. Esta nova luz sobre a Operação Lava Jato de tentar incriminar Lula por todos os meios foi a gota d´água que pôs a nu para a maioria o “Brasil profundo”, o fato incontestável de uma “luta contra a corrupção” altamente politizada. A bola está agora com o procurador-geral. Ou ele se posiciona como um partidário humilde ou com um Ministério Público necessariamente imparcial. Isto poderá implicar “salvar” Dilma, mas ao mesmo tempo pode manchar o capital político de Lula. Para o Supremo Tribunal, agora é mais do que óbvio que eles devem autorizar uma ação legal contra Cunha, tendendo pelo afastamento inevitável como presidente da Câmara. Até mesmo o secretário-geral da OEA, Luis Almagro, apelidou-o de uma farsa surrealista, “o mundo de cabeça para baixo” e de tentar afastar um presidente honesto que sempre favoreceu a luta contra a corrupção. O “segredo” de toda a conspiração parlamentar – alheia para a mídia corporativa ocidental – é que esses bandidos que votarão pelo impeachment no domingo tentam, por todos os meios, escapar das garras da Operação Lava a Jato. Em meio a esse bando é difícil encontrar uma saída pacífica. Supondo que o movimento pelo impeachment seja aprovado na Câmara, o Senado poderia ter até 11 de maio para, finalmente, entregar seu veredito. Rousseff seria então automaticamente suspensa por até 180 dias, durante os quais a presidente será julgada. Missão cumprida?   (*)  Pepe Escobar, jornalista investigativo independente

O líder notoriamente corrupto da câmara baixa do Parlamento Brasileiro, Eduardo Cunha — titular de 11 contas suíças ilegais, indicado na documentação do Panamá e indiciado no Supremo Tribunal Federal — tem agendada uma votação em plenário crucial sobre a possibilidade de impeachment da presidente Dilma Rousseff para este próximo domingo. Domingo, tradicionalmente, é o dia em que a esmagadora maioria dos brasileiros relaxa assistindo a futebol na TV.

Cunha também tentou definir as regras do jogo; a chamada iria começar com os estados do sul mais ricos, que são mais favoráveis ao impeachment – um eufemismo para a mudança de golpe, o culminar da estratégia de guerra híbrido suave implantado desde o início pelos suspeitos sempre aliados com a oligarquia, as elites brasileiras.

Este procedimento de votação agora mudou – irá alternar estados do norte e do sul – para criar uma onda no plenário da Câmara no sentido de impeachment, permitindo assim a entrada gloriosa de outro bandido, o atual vice-presidente Michel Temer. De qualquer forma, a magnífica peça da dupla deve produzir Temer como presidente e Cunha como vice.

A corrida em direção à farsa de domingo foi monopolizada pela mídia mainstream, controlada por quatro famílias, pretendendo criar uma inevitabilidade do impeachment. E, no entanto, todas as apostas estão fora. A oposição à Rousseff, cada vez mais desesperada, não arregimentou todos os dois terços necessários dos traidores no momento da votação na Câmara. A questão deve, então, ser encaminhada ao Senado. E a Suprema Corte também deve pronunciar-se sobre se Rousseff cometeu um “crime de responsabilidade”.

Ela está sendo acusada de truques de contabilidade que supostamente deturpou o estatuto fiscal do governo, algo que todo presidente brasileiro tem feito, para não mencionar líderes em todo o mundo. Em paralelo, grandes vertentes da sociedade civil estão agora se mobilizando para garantir que o golpe será derrotado no Congresso e nas ruas.

Esta saga não tem nada a ver com corrupção, supostamente o principal motivo. É tudo oportunismo político sujo. O plano do conspirador vice-presidente Michel Temer foi revelado através de um vazamento de áudio no noticiário noturno do império Globo. O ângulo era criar um clima positivo no sentido do impeachment, com Temer já atuando como presidente e posicionando-se como o portador pródigo (e facilitador) de boas notícias.

Temer em seguida passou a ultrapassagem da mídia, afirmando que, sim, ele está qualificado para a presidência. Se o movimento de impeachment for derrotado, ele deve permanecer como vice-presidente. Ele insiste que não há golpe, enquanto abominando a possibilidade de uma nova eleição geral, porque isso representaria uma “ruptura constitucional”. Macbeth? Não, apenas um oportunista paroquial humilde. Então, onde está Lula em toda essa confusão?

Gleen Greenwald conduziu uma extensa entrevista com o ex-ícone político presidente, onde ele defende o governo. Compare-o com a vista da cidade de Londres, para qual, é claro, isso não é um golpe. O que importa é o bem-estar dos “investidores estrangeiros”, como se o governo brasileiro tivesse a obrigação em primeiro lugar em relação a eles. Bem, é factível. Mesmo com Rousseff não acusada de qualquer delito, ao contrário do mote do Congresso farsa que quer derrubar seu governo. Dos 65 membros da comissão do Congresso farsa que votaram no impeachment, 35 dos 38 votos dos que votaram a favor estão sendo investigados por corrupção.

A maior parte da sociedade civil, liderada por movimentos sociais e universidades e círculos de intelectuais, se posicionaram com força sobre o golpe. Com uma nuance crucial, eles estão atrás de Lula, pessoalmente, não o Partido dos Trabalhadores, que é de fato contaminado pela corrupção.

Os grandes interesses industriais/bancários concentrados em São Paulo – estado mais rico do Brasil e superpotência econômica do país – apoiados pela maioria dos meios de comunicação agora mudam-se para o centro, com o lema “Não Dilma e nenhum Temer”, já concentrados nas eleições de 2018. No entanto, o que já aconteceu no tabuleiro de xadrez em constante evolução foi a dizimação dos ex-social-democratas, o PSDB.

Esses comparsas de Wall Street/City of London só podem contar com a Lava Jato e as investigações relacionadas com o escândalo e a influência de CEOs de grandes empresas com sede em São Paulo. Seu santo padroeiro é o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, ex-desenvolvimentista social, “Príncipe dos Sociólogos”, que virou um mero paperboy das elites. Ele conseguiu alienar tanto os sociais-democratas quanto os direitistas estridentes.

Sim, isso é tudo sobre as eleições de 2018, porque o impeachment significa, em poucas palavras, a reversão judicial através de um golpe branco do resultado de 2014, quando Dilma foi reeleita. No entanto, todas simulações recentes revelam que Lula ainda tem chance para 2018, embora sua percentagem de rejeição popular permaneça elevada. Por mais que emerja como o grande conciliador, estes números vão ser revertidos.

O governo de Dilma, nos últimos dias, conseguiu organizar uma base um pouco minimalista capaz de impedir o impeachment, mas ainda incapaz de assegurar a governabilidade. Pelo menos o Supremo Tribunal agora parece estar finalmente inclinado a examinar os méritos jurídicos do processo de impeachment. O que é certo é que o império da Globo, no último trecho, vai torcer o voto no sentido do impeachment. É assim que o complexo judicial/mídia funciona.

A Operação Lava Jato é o remix brasileiro da década de 1990 com a Operação Mãos Limpas da Itália. O juiz Gherardo Colombo, que fez parte da Operação Mãos Limpas, visitou o Brasil e explicou o que aconteceu a seguir: a investigação correu para baixo, porque o cidadão italiano médio ficou desmotivado com a divulgação de escândalo após escândalo.

Esta nova luz sobre a Operação Lava Jato de tentar incriminar Lula por todos os meios foi a gota d´água que pôs a nu para a maioria o “Brasil profundo”, o fato incontestável de uma “luta contra a corrupção” altamente politizada. A bola está agora com o procurador-geral. Ou ele se posiciona como um partidário humilde ou com um Ministério Público necessariamente imparcial. Isto poderá implicar “salvar” Dilma, mas ao mesmo tempo pode manchar o capital político de Lula.

Para o Supremo Tribunal, agora é mais do que óbvio que eles devem autorizar uma ação legal contra Cunha, tendendo pelo afastamento inevitável como presidente da Câmara. Até mesmo o secretário-geral da OEA, Luis Almagro, apelidou-o de uma farsa surrealista, “o mundo de cabeça para baixo” e de tentar afastar um presidente honesto que sempre favoreceu a luta contra a corrupção. O “segredo” de toda a conspiração parlamentar – alheia para a mídia corporativa ocidental – é que esses bandidos que votarão pelo impeachment no domingo tentam, por todos os meios, escapar das garras da Operação Lava a Jato.

Em meio a esse bando é difícil encontrar uma saída pacífica. Supondo que o movimento pelo impeachment seja aprovado na Câmara, o Senado poderia ter até 11 de maio para, finalmente, entregar seu veredito. Rousseff seria então automaticamente suspensa por até 180 dias, durante os quais a presidente será julgada. Missão cumprida?

 

(*)  Pepe Escobar, jornalista investigativo independente