“João Goulart foi um idealista que amou o Brasil e deu a sua vida por ele”


Osvaldo Maneschy e Apio Gomes
03/05/2019

Para o historiador Wendel Pinheiro, membro do Diretório Nacional do PDT e ativo militante da Fundação Leonel Brizola – Alberto Pasqualini, a história e os trabalhistas ainda não têm a real dimensão “da grandeza e do legado de Jango”, tamanha a dimensão de sua luta pelas reformas de base. Wendel acredita que isto está mudando, mas ainda é preciso fazer justiça ao presidente João Goulart “dentro do que ele significa para o eixo do Trabalhismo”, ao lado de Getúlio Vargas e Leonel de Moura Brizola.

“As reformas de base são uma agenda atual que nenhum governo progressista, como os de Lula e da Dilma, teve capacidade de fazer”, argumentou Wendel, citando, entre outros exemplos, a consolidação da Eletrobrás e a criação do 13° salário, a partir de demandas de trabalhadores. Jango também, lembrou, foi o responsável pela prioridade dada à reforma universitária, dentro das reformas de base: tema atualíssimo dentro do movimento estudantil até hoje.

Na opinião de Wendel, “o PDT não tem a compreensão do legado de João Goulart para o âmbito daquilo que significa o Trabalhismo brasileiro”.

Sobre a Campanha da Legalidade, fundamental para a posse de Jango, explica que “a gente só se dá conta daquilo que significou quando fazemos o exercício de história comparada e vemos os retrocessos que ocorreram no Brasil, principalmente no pós-golpe de 2016”.

Na sua visão, a Legalidade “foi um dos maiores movimentos de construção da consciência popular dos brasileiros, em que o povo começou a ser senhor do processo político”, a partir da insurreição de Brizola diante do golpe em marcha. “Infelizmente a campanha da Legalidade ainda é muito mal-estudada no ensino fundamental e no ensino médio”, observou.

Por conta das reformas de base, Wendel coloca o presidente João Goulart no mesmo patamar de Friedrich Engels e Fidel Castro, porque os três “tiveram a sensibilidade de colocar como suas a agenda da classe trabalhadora”.

A reforma tributária, por exemplo, é mais do que necessária porque discursos hipócritas tentam mascarar a realidade de que os brasileiros são obrigados a trabalhar 130, 140, 150 dias por ano para pagar impostos; enquanto grupos econômicos sonegam impostos que chegam, anualmente, a 400, 500 bilhões de reais.

“Jango queria fazer a reforma tributária para privilegiar o povo brasileiro”, inclusive coibindo a farra das transnacionais que atuam no país, via lei de remessas de lucros ao exterior. Outra bandeira de luta sua foi a reforma urbana – em resposta à pergunta como democratizar o acesso à moradia, diante da especulação imobiliária.

O presidente João Goulart também colocou a necessidade de a reforma universitária em discussão, tema que até hoje está na ordem do dia.

“A meu ver, João Goulart está entre um dos poucos da classe dominante que assumiu a agenda da classe trabalhadora”. E por conta da defesa da reforma agrária, Wendel lembrou que até o próprio Prestes achava que o projeto do Jango era radical.

“Jango, com sua origem, como grande estancieiro que era, propugnava uma reforma agrária à esquerda daquilo que o Partido Comunista defendia”, frisou. E é por isto que considera as reformas de base muito atuais, até hoje.

Wendel tem a posição de que o PDT, hoje, defenda – a fundo – as reformas de base propostas lá atrás por Jango: “Claro que atualizadas a partir das demandas do Século 21”, porque as considera pertinentes para a realidade atual e de acordo com o que o povo brasileiro precisa.

Sobre o golpe de 64, Wendel considera essencial colocar, de forma muito clara e categórica, que o golpe não foi apenas militar, mas civil-militar – porque quando você coloca a responsabilidade apenas nos militares, isenta-se de responsabilidade histórica “setores da burguesia nacional, sócios minoritários do capitalismo internacional”; os mesmos que estiveram à frente da transição pós-ditadura e, antes, posição ativa para o desencadeamento do golpe, participando, por exemplo, de atos como a marcha do padre Patrick Peyton para desestabilizar o governo Jango com apoio da direita da Igreja católica.

Para esses setores, à direita, era comunista qualquer tentativa de democratização dos direitos sociais para o conjunto dos brasileiros; qualquer tentativa de modernização da ordem estruturante; qualquer mudança que pudesse trazer justiça social ao povo.

“A gente sabe que o João Goulart foi claramente influenciado pela cartilha de Alberto Pasqualini, que preconizava a existência do capitalismo; mas com justiça social e redistribuição de renda para o conjunto da classe trabalhadora”. Por isto, Wendel entende que o golpe civil-militar de 1964 foi uma forma da classe dominante, dos setores antiprogressistas, frearem todos os avanços que Jango fomentava através de suas políticas sociais.

O golpe contra Jango, na opinião de Wendel, provou “que há setores dentro do país que são contra a ideia de emancipação do Brasil, buscando o seu desenvolvimento independente”. E mais: esses mesmos setores são contra todas as agendas que, em defesa da soberania nacional, tenham como componentes “a distribuição de renda volta para os interesses do povo brasileiro”.

Na visão de Wendel, Jango era um progressista e grande articulador desde quando presidiu o PTB gaúcho, depois o PTB nacional, assumindo o Ministério do Trabalho, depois a Vice-Presidência da República e, por último, a Presidência. “Jango articulava sempre olhando para frente”, ao contrário de muitos que fazem composição para recuar.

“Em momento algum Jango articulou olhando para trás ou recuando por interesses particularistas. Pelo contrário, todas as suas articulações visaram a interesses voltados ao país e à classe trabalhadora”. Isto porque, acrescentou, Jango era um homem sensível e de grande coração.

“É possível fazer política com o coração (…) Muitas vezes acham que as pessoas que têm coração, na política, são meramente ingênuas. Mas não. É o conteúdo ideal, olhando a política visando ao bem das pessoas a partir do olhar humano”, argumentou.

Exatamente por esses dois pontos, que considera essenciais na política, Wendel Pinheiro acredita que Jango foi um idealista que amou o Brasil e deu a sua vida por ele.

Confira a entrevista completa abaixo: