Almino Afonso: “João Goulart tinha especial interesse em ouvir o que os jovens tinham a dizer”


Osvaldo Maneschy e Apio Gomes
17/04/2019

Quando Almino Afonso conheceu João Goulart, em 1959, ele já era Vice-Presidente da República e presidente nacional do PTB. Jango era um político experiente, herdeiro de Getúlio Vargas, enquanto Almino não passava de um jovem deputado amazonense de primeiro mandato, recém-chegado ao Rio de Janeiro, quando ainda era Capital Federal.

Esta aparente distância não impediu que construíssem sólida relação política, mesmo que Almino Afonso militasse no então chamado “Grupo Compacto” do PTB, ala que ele próprio define como “à esquerda da esquerda, do qual eu era, se você me permite uma pontada de vaidade, talvez uma das principais lideranças”.

A aproximação entre eles se deu, segundo Almino, porque Jango era um homem aberto, influente, e tinha especial interesse em ouvir o que os jovens tinham a dizer.

“Nossa amizade nasceu do encontro entre um político experiente e outro jovem”, ambos preocupados com o futuro do Brasil – já naquela época, tinham um denominador comum: a defesa da exploração do petróleo brasileiro pela Petrobrás.

Almino explica que a questão do petróleo já dividia a sociedade, porque – contra o monopólio estatal de petróleo instituído por Vargas, ao criar a Petrobrás em 1953 – já se erguiam vozes da direita, muitas ligadas à UDN, em defesa da exploração do petróleo brasileiro pela iniciativa privada.

Segundo Almino, os privatistas defendiam também a participação do capital estrangeiro na atividade petrolífera, de acordo com a tese de que o Brasil não tinha e nem teria recursos para explorar petróleo dentro de seu território. Por trás desta linha de pensamento, a defesa disfarçada dos interesses do governo dos Estados Unidos: “Isto foi um divisor de águas profundo”.

Amigo de Jango, alinhado com as reformas de base, Almino Afonso saudou a ideia de homenagear o presidente João Goulart no centenário de seu nascimento, porque Jango, na sua opinião, “merece, na história, lugar muito maior do que ocupa”.

Discutir o petróleo, na visão de Almino Afonso, sobretudo o monopólio estatal, “é encarnar Getúlio”. E, por trás deste debate, quem também sempre esteve foram os interesses dos Estados Unidos, com amplos reflexos na vida nacional – promotores, inclusive, do golpe de estado de 1964.

Almino Afonso descreve esta época: a UDN era um partido com uma vanguarda liberal-conservadora, com muitas figuras com valor intelectual; mas, no centro, era o anti-getulismo ferrenho. Em um debate no plenário da Câmara, “fiz esta pergunta: deputado Adauto Lúcio Cardoso, o que há na alma da UDN que não consegue viver por si própria, sem o anti-getulismo? Quase que eu diria que vocês existem, na medida em que Getúlio existiu. É a controvérsia da História dentro de vocês? O que há?”

Este sentimento, explica, também estava presente em outros campos da sociedade brasileira, inclusive na intelectualidade e exemplifica com o fato de que, embora fosse líder da bancada do PTB no Congresso, seu nome não era citado pelo jornal “O Estado de São Paulo”, só era tratado como “líder petebo-comuno-nacionalista”.

Confira a entrevista completa abaixo: