Quem tem medo do Ciro Gomes?


Everton Gomes
07/02/2017

Depois do impeachment da presidenta Dilma Rousseff, certo discurso apresentado na imprensa progressista – e também por alguns intelectuais – tem me incomodado bastante. Refiro-me à insistência na tese de que a recomposição da esquerda nacional é a reconstrução do PT.

Isto é uma meia verdade. Nada contra o PT, diga-se de passagem; mas sim com esta definição simplista de que o campo progressista é composto só pelo Partido dos Trabalhadores. Por que ignorar e esconder o Trabalhismo Brasileiro e o PDT?

Embora tenha pela corrente petista grande afinidade, além de ver nela a expressão de um projeto generoso e progressista para o Brasil, uma indagação está sempre presente: o que leva importantes veículos da imprensa especializada a esconderem os herdeiros de Getúlio, Jango e Brizola nas suas análises?

Afinal, o PDT insere-se neste cenário do pós-Lula, com um objetivo claro: a retomada do “fio da história”. E, para isto, apresenta, assume e declara a candidatura de Ciro Gomes à Presidência da República que, segundo alguns respeitados institutos de pesquisa, é de grande viabilidade eleitoral.

Some-se a isto o fato de o PDT ter sido o partido da esquerda nacional que mais cresceu nas eleições municipais de 2016, tendo agora o maior número de prefeitos (338) e vereadores (3.756), neste importante campo da política brasileira.

Das capitais brasileiras, o PDT governa cidades importantes, como Natal (RN), São Luís (MA) e Fortaleza (CE). Além disto, na mais recente fotografia de representação em governos, o PDT tornou-se mais expressivo que o PT, já que aconteceu uma queda abrupta dos votos petistas nas últimas eleições municipais.

Neste momento político nacional, em relação a identidade ideológica clássica dos progressistas, o PDT tem uma dimensão parelha ao PT, a seus aliados menores (PCdoB) e mesmo a partidos surgidos como dissidência: PSTU, PSOL, PCO.

Basta uma análise, com a atenção necessária, das últimas pregações do candidato a presidente pelo PDT, Ciro Gomes, que se encontrará uma profunda crítica ao sistema financeiro; além de reiterado compromisso de combate às agendas do governo Temer, tais como a implementação da PEC 55, as “reformas” trabalhista e a previdenciária.

Vou além: no plano da esquerda, os trabalhistas foram os que atuaram de forma mais contundente, nos episódios recentemente, ao afirmar seus compromissos definidos na Carta de Lisboa. O PDT foi o primeiro partido a fechar questão contra o golpe que acabou sendo vitorioso.

Recentemente, em duas decisões distintas, o PDT puniu com rigor – que chegou à expulsão de parlamentares de suas bancadas nas duas casas do Congresso – os que ousaram votar contrariando posições históricas assumidas pelo partido: consideradas cláusulas pétreas pedetistas.

Na eleição para a presidência da Câmara dos Deputados, o PT por pouco não deu o abraço do afogado e se uniu àqueles que golpearam o governo Dilma. Ora bolas! O PT cogitou o apoio a candidatura de Rodrigo Maia (DEM) contra a construção de uma candidatura unificada de esquerda democrática. Posteriormente mesmo aceitando a candidatura da esquerda, o que se viu foram muitos votos petistas escoarem em favor dos seus algozes. Seria a “Síndrome de Estocolmo petista”?

É esta a corrente que os articulistas pretendem definir como a que detém o monopólio da esquerda? A mesma que deixou de lado a denúncia do golpe e preferiu se lançar aos conchavos palacianos com os grupos que impulsionam a mais severa agenda de reforma contra os trabalhadores.

Repito! Nada contra o PT ou seus seguidores, mas a verdade é que existem muitos outros tons de vermelho no caleidoscópio da esquerda popular tupiniquim. Este pluralismo vai muito além das fronteiras do lulo-petismo como pudemos assistir. Reafirmo: esconder os Trabalhistas e o PDT é promover uma realidade inexistente e maquiada.

Por derradeiro, torna-se importante saber se escondem uma verdade patente por mero desconhecimento histórico da realidade – o que acho muito difícil – ou por opção pragmática e hegemônica: preferem fabricar narrativas falsas, ao invés de permitir alternativas democráticas e progressistas dentro da esquerda popular, dispostas a disputar eleitoralmente o mesmo campo que o PT também ocupa.

Para estes pragmáticos, o monopólio da esquerda nacional é deles; e disto não abrem mão, mesmo quando o que está em jogo é a democracia e a retomada de um projeto nacional que garanta a qualidade de vida para o povo brasileiro.

 

*Everton Gomes é presidente nacional da Juventude Socialista e Secretário Nacional de Organização do PDT. Mestre em Ciência Política pela Universidade Federal Fluminense, pesquisa partidos políticos e democracia.