“Leonel Brizola, minha referência!” (PARTE ll), por Wendel Pinheiro


Wendel Pinheiro
22/01/2020

A perda da sigla do PTB fora uma perda irreparável para um líder trabalhista que não somente ajudara a fundar e construir o PTB pré-1964, bem como prosseguiria o legado nacional-reformista de Jango e a linha trabalhista de Vargas. O seu choro ao rasgar uma folha com a sigla do PTB ao lado de Doutel de Andrade no Hotel Ambassador em 12 de maio de 1980 representava a dor pungente de todos os brasileiros que creditavam à legenda petebista como o caudatário legítimo das demandas históricas populares.

De qualquer forma, a partir da fundação do PDT em 26 de maio de 1980, muitos seriam os desafios para a nova agremiação trabalhista que mal começara com 10 deputados federais e que iniciara com setoriais como a Juventude Trabalhista e o Movimento de Mulheres em 1981. De quebra, os desafios que Brizola teria em consolidar a imagem do PDT se daria na construção deste partido nos mais diversos rincões do país, para além do eixo histórico Rio Grande do Sul/Rio de Janeiro.

Como destaque no processo de redemocratização, Brizola protagonizou politicamente em um dos cenários políticos mais peculiares nas eleições de 1982. A eleição para o Governo do Rio de Janeiro possuía um caráter plebiscitário e a candidatura do líder trabalhista adquiriu contornos de cunho oposicionista, eclipsando a rivalidade artificializada entre os luas pretas do PMDB e os governistas do PDS, ex-ARENA. Vencendo os prognósticos eleitorais, Brizola ainda enfrentaria e denunciaria o esquema da Proconsult que favorecia abertamente o candidato da ditadura, Moreira Franco.

Como governador, suas políticas estiveram essencialmente voltadas para a implementação dos Direitos Humanos e para a consolidação dos Direitos Sociais. Além da construção de 513 CIEPs nos dois governos e a instituição do ensino em tempo integral, com a visão humanizada de uma educação democrático-popular, Brizola asseguraria a política de Direitos Humanos voltada para as mulheres, os negros e os moradores das comunidades.

No que concerne a política de segurança pública, a lógica se tornaria a partir do investimento na prevenção e no tratamento de igualdade entre os moradores dos subúrbios e das comunidades com os dos bairros nobres – o que provocaria fortes tensões sociais e políticas da própria direita carioca, ao associar a política de Direitos Humanos na Segurança Pública como o ato de “apaniguamento” com o banditismo urbano.

Seria com Brizola que, coibindo os abusos e os esquemas do Carnaval, criaria – a partir do projeto de Oscar Niemeyer e de Darcy Ribeiro – a passarela do samba na Praça Onze, conhecido também como o Sambódromo. Além da criação deste equipamento público, o mesmo seria utilizado no decorrer do ano como o espaço em excelência para a promoção do ensino em tempo integral para as crianças, além da formação profissional e artística de jovens e adultos.

Tais medidas, feitas em tempos de inflação galopante com mais de 210% no término da ditadura, mostravam na prática o grau de ousadia de Brizola na promoção de políticas públicas. Sem a neoliberal Lei de Responsabilidade Fiscal criada mais tarde por FHC, Brizola chegou a auferir 57% dos recursos para a educação no Rio de Janeiro em 1993.

De qualquer forma, mesmo com um pródigo governo democrático-popular, Brizola não emplacara o seu sucessor em 1986, face ao advento do Plano Cruzado. Não seria por falta de avisos constantes do líder trabalhista sobre o caráter eleitoreiro deste plano. Mesmo com a derrota de Darcy Ribeiro no Rio de Janeiro e de Aldo Pinto no Rio Grande do Sul, o fracasso do Plano Cruzado permitiu ao PDT voltar com força no cenário nacional, a ponto de fomentar as condições para que Brizola fosse visto como um dos principais presidenciáveis entre 1988 e 1989.

É bem verdade que em meio aos mais de 900% de inflação promovidos pelo Governo Sarney, Brizola se colocava como a imagem de um estadista dotado de experiência e voltado aos interesses populares. Sobretudo, oriundo da corrente trabalhista que, com Vargas e Goulart, comprovara uma série de serviços prestados ao país.

Entretanto, o discurso do “novo” pautaria o mote das eleições de 1989 e, por margem irrisória de votos, Brizola não conseguiria ir ao segundo turno. Com a presença de Collor na liderança das pesquisas e dos cenários eleitorais, coube a Brizola um gesto extremo de altruísmo político ao apoiar a candidatura de Lula naquela conjuntura – ainda que o procer petista não tivesse a mesma trajetória, bagagem e capital político que Brizola tinha.

A vitória de Collor faria com que o PDT se posicionasse como uma oposição propositiva com a sua bancada de 46 deputados federais e de três governadores, além da eleição de Darcy Ribeiro para o Senado. Dentre os governadores, Brizola seria reeleito em 1990 e manteria as mesmas ações políticas do primeiro governo – incluindo a manutenção da encampação das empresas de transporte público em prol da população. De quebra, além da criação da Universidade Federal do Norte Fluminense, Brizola manteria uma política de desenvolvimento e de integração entre as regiões do estado fluminense.

Perseguido pelas Organizações Globo e mesmo se utilizando do Direito de Resposta, Brizola perderia as eleições presidenciais de 1994. O uso indevido e eleitoreiro do Plano Real favorecera FHC a ponto do PSDB, junto com outros partidos de direita, elegê-lo no primeiro turno.

Brizola seria um arauto da defesa do Estado Nacional e um notório opositor das políticas neoliberais promovidas pelo governo tucano entre 1995 e 2002. Neste ínterim, em nome dos interesses nacionais, Brizola não só articulou a unidade das esquerdas bem como, em um gesto de extremo altruísmo, tornou-se vice de Lula, no entendimento de que aquela composição serviria para derrotar FHC. Entretanto, a reeleição do procer tucano não desanimaria Brizola, a ponto de usar a campanha de Prefeito do Rio de Janeiro para denunciar a política do “Estado Mínimo” de FHC que implicava no aumento da informalidade, do desemprego e da marginalidade.

Mesmo derrotado eleitoralmente nas eleições de 2000 para Prefeito e de 2002 para o Senado, Brizola era reconhecido como um patrimônio político nacional ainda em vida – ainda que nem sempre os setores de direita e de esquerda quisessem ouvi-lo. Mas os seus discursos, baseados na sua extrema coerência ideológica e no seu visionarismo, marcava o estilo direto, metafórico e de um humor carregado de ironias e de ilustrações promovida pelo líder trabalhista.

Sua morte em 21 de junho de 2004 se tornou um ponto paradigmático para os trabalhistas. Como prosseguir institucionalmente as metas ideológicas do PDT, herdeiro do PTB pré-1964? Como fugir das chacotas, chistes e comentários carregados de sarcasmo de que, com a morte de Brizola, o PDT acabaria?

O exemplo de Brizola marcaria aqueles que, como eu, puderam ainda acompanhá-lo em vida. Ou… aqueles que não puderam conhecê-lo pessoalmente ou foram privados de vê-lo por iniciar a sua vida política após a morte de Leonel Brizola.

Brizola se confunde com a História do Brasil Republicano.

Em tempos de crise do pós-golpe e de um governo antipopular e antinacionalista como o de Bolsonaro, os alertas de Brizola se tornam cada vez mais atuais. As exortações proféticas do líder trabalhista encontram eco e mostram explicações atemporais capazes de dar o norte político para os setores nacional-democráticos e populares.

A vida de Leonel Brizola é um paradigma não apenas para os trabalhistas, mas para o povo brasileiro! Seu desprendimento e coragem são marcas de um homem público que dedicou seis décadas de sua vida em prol dos interesses do povo e da nação.

BR de Brasil. BR de Brizola!

Saudações Trabalhistas!