Cristovam Buarque: Brizola foi um político de presença

Discurso do Senador Cristovam Buarque
em homenagem a Leonel Brizola em
Sessão Solene do Senado Federal – 10/6/2008




Não é possível deixar passar datas importantes da vida dos grandes políticos sem lembrá-las. Esse é um gesto até educacional com todos os jovens que não tiveram a oportunidade de vivenciar a política no seu tempo. Por isso, hoje, fazemos questão de lembrar o grande nome que foi Leonel Brizola.



Medimos os grandes políticos pela presença deles no cenário nacional quando estão vivos, mas medimos a importância dos maiores de todos pela ausência deles. E Brizola foi um político de presença firme ao longo de todas as décadas de sua atividade política. Ele nunca esteve discreto na vida pública brasileira. Sempre teve um lado claro, firme, em defesa da Nação brasileira, em defesa dos trabalhadores brasileiros, em defesa da democracia no Brasil.

Brizola foi um político de presença, mas, hoje, prefiro falar – até porque estamos lembrando a data de seu falecimento – sobre sua ausência, sobre a falta que ele faz em momentos em que o Brasil enfrenta desafios que nos deixam – reconheçamos – perplexos, sem dar a resposta de que o povo e a história precisam.

Tomemos o problema da Amazônia nesse momento da história do Brasil. Brizola faz falta. A palavra dele faz falta. O grito dele em defesa da soberania nacional faz falta. Alguns de nós até que falam nisso, mas sem a força, sem a firmeza, sem a maneira que, além de firme, é entendida por todo o povo. Brizola faz grande falta nesse momento em que o Brasil precisa afirmar, diante do mundo inteiro, que a Amazônia é nossa.

A fala de Brizola não chega para nós por que ele nos deixou há quatro anos. Mas não é só em relação à soberania do Brasil sobre a Amazônia que sentimos falta da presença de Brizola aqui. Faz falta nitidez na política. Nós fazemos política hoje como se não houve nitidez seja no comportamento, seja nos princípios fundamentais que unem diversos políticos naquilo que a gente chama de partido. Brizola faz falta nesse mundo em que, aparentemente, não há bandeiras claras, nítidas. Ele carregava em si uma bandeira. Ele falava com uma posição, com um lado, com uma nitidez de princípios e de propostas, sem esse furta-cor que hoje caracteriza as bandeiras dos partidos no Brasil. Brizola faz falta na soberania nacional, na nitidez de posições que digam: existe um lado, e existe outro lado, não esse meio-de-campo em que todo mundo hoje está se misturando.

Brizola faz muita falta, sim, porque era a voz, respeitada nacionalmente, capaz de colocar no cenário nacional a prioridade radical pela educação. É diferente o discurso que põe essa bandeira na boca de outros ou na boca do grande Leonel Brizola, até porque ele, fez esse discurso cinqüenta anos atrás. Ele estava adiantado demais em um mundo que achava que o futuro era a industrialização, que o futuro era a economia e que à economia bastava contar apenas com as mãos de alguns trabalhadores com o mínimo de habilidade e com algum cursinho de um dos institutos do Sistema S. Ele previu isso bem antes do tempo.

Hoje, no momento em que o grande capital é o conhecimento, no momento em que a base do progresso é a educação, a fala de Brizola estaria incendiando este País por uma revolução, não por pequenos gestos que fizessem com que aumentasse o número de crianças na escola, quando não são escolas o local para onde elas estão indo: são semi-escolas, pseudo-escolas, quase escolas, mas não escolas verdadeiras. Brizola está fazendo falta, porque ele criou, há muito tempo, a verdadeira escola, que era o Centro Integrado de Educação Pública (Ciep): a escola de horário integral. Mas ele falou tão na frente, tão adiantado, que não conseguiu levar isso para o Brasil inteiro, que não conseguiu se fazer Presidente da República com esse discurso. Hoje, certamente, ele se faria Presidente, porque há um sentimento propício, casando com a vontade que ele tinha décadas atrás.

Brizola faz falta por que seria capaz de conduzir o Brasil nessa revolução educacional que defendia em um tempo, antes de ser essa a verdadeira razão da revolução.

Ele faz falta, sem dúvida alguma, no momento em que o Brasil tem, outra vez, uma grande oportunidade – como teve na época da cana-de-açúcar, do ouro, do café, da própria industrialização –, uma grande chance, com a possibilidade de se transformar em fonte importante de energia, seja pelo petróleo, que estamos descobrindo cada vez mais, seja pela possibilidade dos biocombustíveis.

Brizola faz falta por que defenderia que o Brasil aproveitasse essa oportunidade, mas tomando cuidados, para que não se repetisse, com essas alternativas, o ocorrido com o açúcar, com o café, com o ouro, com a borracha. Ele seria a voz capaz de dizer: “Esse é o caminho, vamos aproveitar a chance. Esse é o caminho, vamos fazer com que seja uma chance definitiva na transformação não apenas da economia, mas da sociedade brasileira inteira”.

O grande Brizola faz falta no momento em que as leis trabalhistas exigem alguns ajustes, mas não podem ser ajustes contra os interesses dos trabalhadores. Ele faz falta por que a voz dele seria a melhor para dizer que aqui estão as mudanças que podemos fazer, aqui está o limite além do qual a gente não vai, aqui está a maneira de mudar as leis, melhorando-as, não prejudicando os trabalhadores.

Ele está fazendo falta, nesse momento, porque a voz dele daria uma força, uma credibilidade que nenhum de nós, políticos ainda vivos, temos.

E é isso que faz dele o político maior, porque o grande político se dá na presença, mas o político maior se dá no sentimento da sua ausência.

Brizola faz falta neste momento em que a globalização é um processo irreversível, mas não pode ser um processo destruidor da soberania de nenhum país. Brizola seria o nome para, neste momento da história, hoje, nos próximos dez anos ou quinze anos, definir como podemos viver a globalização sem diminuir a soberania. Ele era o nome para dizer que o Brasil vive em um planeta que é uma espécie de condomínio, onde somos donos da nossa parte, mas temos de respeitar o resto do condomínio.

E faz falta uma palavra como a dele, que tinha força para dizer o que era possível e o que não era possível, o que devia e o que não devia ser feito, fazendo o que parecia transigir, mas com uma linha firme para onde ele queria ir, sem medo de, às vezes, dizer que precisamos fazer alguns ajustes. Todos sabiam que ele tinha claro o destino e que os ajustes não eram desvios. Brizola faz falta, porque ele era um político de ajustes, mas jamais de desvios. E a história dele mostrava que ele, quando dizia para ajustar, não estava caindo na tentação do desvio. Hoje, qualquer um de nós que fala em ajuste cai imediatamente sob a suspeita, não do ajuste, mas do desvio. Ele tinha os princípios, a história dos princípios, a palavra dos princípios, a cara de princípios. Por isso, faz falta.

Brizola faz uma profunda falta também – não vou continuar insistindo na sua ausência –, neste momento do vazio ideológico que vive a política no Brasil e, diria até, no mundo inteiro, porque ele nunca foi contaminado por uma ou outra ideologia. Ele construiu sua ideologia. Ele foi capaz de não cair nos “ismos” e criar o trabalhismo junto com Getúlio, com Jango, com Pasqualini e com outros, mas a linha dele não seria afetada pelo debacle que a gente viu da maneira como o socialismo era feito. A queda do socialismo no leste não afetou em nada o pensamento, a linha e a credibilidade de Brizola. Mas também o fracasso do capitalismo, que provoca o aquecimento global, que aumenta a desigualdade, a ponto de fazer com que certos seres humanos não se sintam mais semelhantes a outros, esse fracasso do capitalismo e o do socialismo não atingiriam as idéias que Brizola defendia.

Por isso , ele faz falta imensa nesse vazio de bandeiras, nesse vazio de ideologias, porque ele tinha a sua. E a sua, felizmente, deixou seguidores e mesmo aqueles que não são seus seguidores são pessoas que respeitam aquilo que ele fez, aquilo que defendeu.

Hoje, lembramos a todos que houve um político que foi grande quando vivo e que ficou ainda maior quando a gente sente sua ausência. Esta é uma tarde para se lembrar a ausência, que é a melhor forma de se medir o tamanho de um político.

Viva Brizola, pelo seu tamanho em vida e pelo sentimento de ausência que ele nos passa!

E concluo, dizendo que, se ele era tão grande e se sua ausência é tão forte, o que nos cabe fazer é lutar mais ainda, porque, se a gente não tem um Brizola hoje conosco, será preciso haver dezenas, centenas, milhares de pequenos como nós, para, juntos, tentarmos preencher o vazio que ele nos deixa.

Esta é uma oportunidade para lembrar Brizola, mas, sobretudo, para lembrar nossa responsabilidade, para continuarmos carregando as bandeiras que ele deixou.
Essas eram minhas palavras com meu carinho por ter sido brizolista e por continuar como tal hoje em dia.

Discurso do Senador Cristovam Buarque
em homenagem a Leonel Brizola em
Sessão Solene do Senado Federal – 10/6/2008

Não é possível deixar passar datas importantes da vida dos grandes políticos sem lembrá-las. Esse é um gesto até educacional com todos os jovens que não tiveram a oportunidade de vivenciar a política no seu tempo. Por isso, hoje, fazemos questão de lembrar o grande nome que foi Leonel Brizola.

Medimos os grandes políticos pela presença deles no cenário nacional quando estão vivos, mas medimos a importância dos maiores de todos pela ausência deles. E Brizola foi um político de presença firme ao longo de todas as décadas de sua atividade política. Ele nunca esteve discreto na vida pública brasileira. Sempre teve um lado claro, firme, em defesa da Nação brasileira, em defesa dos trabalhadores brasileiros, em defesa da democracia no Brasil.

Brizola foi um político de presença, mas, hoje, prefiro falar – até porque estamos lembrando a data de seu falecimento – sobre sua ausência, sobre a falta que ele faz em momentos em que o Brasil enfrenta desafios que nos deixam – reconheçamos – perplexos, sem dar a resposta de que o povo e a história precisam.

Tomemos o problema da Amazônia nesse momento da história do Brasil. Brizola faz falta. A palavra dele faz falta. O grito dele em defesa da soberania nacional faz falta. Alguns de nós até que falam nisso, mas sem a força, sem a firmeza, sem a maneira que, além de firme, é entendida por todo o povo. Brizola faz grande falta nesse momento em que o Brasil precisa afirmar, diante do mundo inteiro, que a Amazônia é nossa.

A fala de Brizola não chega para nós por que ele nos deixou há quatro anos. Mas não é só em relação à soberania do Brasil sobre a Amazônia que sentimos falta da presença de Brizola aqui. Faz falta nitidez na política. Nós fazemos política hoje como se não houve nitidez seja no comportamento, seja nos princípios fundamentais que unem diversos políticos naquilo que a gente chama de partido. Brizola faz falta nesse mundo em que, aparentemente, não há bandeiras claras, nítidas. Ele carregava em si uma bandeira. Ele falava com uma posição, com um lado, com uma nitidez de princípios e de propostas, sem esse furta-cor que hoje caracteriza as bandeiras dos partidos no Brasil. Brizola faz falta na soberania nacional, na nitidez de posições que digam: existe um lado, e existe outro lado, não esse meio-de-campo em que todo mundo hoje está se misturando.

Brizola faz muita falta, sim, porque era a voz, respeitada nacionalmente, capaz de colocar no cenário nacional a prioridade radical pela educação. É diferente o discurso que põe essa bandeira na boca de outros ou na boca do grande Leonel Brizola, até porque ele, fez esse discurso cinqüenta anos atrás. Ele estava adiantado demais em um mundo que achava que o futuro era a industrialização, que o futuro era a economia e que à economia bastava contar apenas com as mãos de alguns trabalhadores com o mínimo de habilidade e com algum cursinho de um dos institutos do Sistema S. Ele previu isso bem antes do tempo.

Hoje, no momento em que o grande capital é o conhecimento, no momento em que a base do progresso é a educação, a fala de Brizola estaria incendiando este País por uma revolução, não por pequenos gestos que fizessem com que aumentasse o número de crianças na escola, quando não são escolas o local para onde elas estão indo: são semi-escolas, pseudo-escolas, quase escolas, mas não escolas verdadeiras. Brizola está fazendo falta, porque ele criou, há muito tempo, a verdadeira escola, que era o Centro Integrado de Educação Pública (Ciep): a escola de horário integral. Mas ele falou tão na frente, tão adiantado, que não conseguiu levar isso para o Brasil inteiro, que não conseguiu se fazer Presidente da República com esse discurso. Hoje, certamente, ele se faria Presidente, porque há um sentimento propício, casando com a vontade que ele tinha décadas atrás.

Brizola faz falta por que seria capaz de conduzir o Brasil nessa revolução educacional que defendia em um tempo, antes de ser essa a verdadeira razão da revolução.

Ele faz falta, sem dúvida alguma, no momento em que o Brasil tem, outra vez, uma grande oportunidade – como teve na época da cana-de-açúcar, do ouro, do café, da própria industrialização –, uma grande chance, com a possibilidade de se transformar em fonte importante de energia, seja pelo petróleo, que estamos descobrindo cada vez mais, seja pela possibilidade dos biocombustíveis.

Brizola faz falta por que defenderia que o Brasil aproveitasse essa oportunidade, mas tomando cuidados, para que não se repetisse, com essas alternativas, o ocorrido com o açúcar, com o café, com o ouro, com a borracha. Ele seria a voz capaz de dizer: “Esse é o caminho, vamos aproveitar a chance. Esse é o caminho, vamos fazer com que seja uma chance definitiva na transformação não apenas da economia, mas da sociedade brasileira inteira”.

O grande Brizola faz falta no momento em que as leis trabalhistas exigem alguns ajustes, mas não podem ser ajustes contra os interesses dos trabalhadores. Ele faz falta por que a voz dele seria a melhor para dizer que aqui estão as mudanças que podemos fazer, aqui está o limite além do qual a gente não vai, aqui está a maneira de mudar as leis, melhorando-as, não prejudicando os trabalhadores.

Ele está fazendo falta, nesse momento, porque a voz dele daria uma força, uma credibilidade que nenhum de nós, políticos ainda vivos, temos.

E é isso que faz dele o político maior, porque o grande político se dá na presença, mas o político maior se dá no sentimento da sua ausência.

Brizola faz falta neste momento em que a globalização é um processo irreversível, mas não pode ser um processo destruidor da soberania de nenhum país. Brizola seria o nome para, neste momento da história, hoje, nos próximos dez anos ou quinze anos, definir como podemos viver a globalização sem diminuir a soberania. Ele era o nome para dizer que o Brasil vive em um planeta que é uma espécie de condomínio, onde somos donos da nossa parte, mas temos de respeitar o resto do condomínio.

E faz falta uma palavra como a dele, que tinha força para dizer o que era possível e o que não era possível, o que devia e o que não devia ser feito, fazendo o que parecia transigir, mas com uma linha firme para onde ele queria ir, sem medo de, às vezes, dizer que precisamos fazer alguns ajustes. Todos sabiam que ele tinha claro o destino e que os ajustes não eram desvios. Brizola faz falta, porque ele era um político de ajustes, mas jamais de desvios. E a história dele mostrava que ele, quando dizia para ajustar, não estava caindo na tentação do desvio. Hoje, qualquer um de nós que fala em ajuste cai imediatamente sob a suspeita, não do ajuste, mas do desvio. Ele tinha os princípios, a história dos princípios, a palavra dos princípios, a cara de princípios. Por isso, faz falta.

Brizola faz uma profunda falta também – não vou continuar insistindo na sua ausência –, neste momento do vazio ideológico que vive a política no Brasil e, diria até, no mundo inteiro, porque ele nunca foi contaminado por uma ou outra ideologia. Ele construiu sua ideologia. Ele foi capaz de não cair nos “ismos” e criar o trabalhismo junto com Getúlio, com Jango, com Pasqualini e com outros, mas a linha dele não seria afetada pelo debacle que a gente viu da maneira como o socialismo era feito. A queda do socialismo no leste não afetou em nada o pensamento, a linha e a credibilidade de Brizola. Mas também o fracasso do capitalismo, que provoca o aquecimento global, que aumenta a desigualdade, a ponto de fazer com que certos seres humanos não se sintam mais semelhantes a outros, esse fracasso do capitalismo e o do socialismo não atingiriam as idéias que Brizola defendia.

Por isso
, ele faz falta imensa nesse vazio de bandeiras, nesse vazio de ideologias, porque ele tinha a sua. E a sua, felizmente, deixou seguidores e mesmo aqueles que não são seus seguidores são pessoas que respeitam aquilo que ele fez, aquilo que defendeu.

Hoje, lembramos a todos que houve um político que foi grande quando vivo e que ficou ainda maior quando a gente sente sua ausência. Esta é uma tarde para se lembrar a ausência, que é a melhor forma de se medir o tamanho de um político.

Viva Brizola, pelo seu tamanho em vida e pelo sentimento de ausência que ele nos passa!

E concluo, dizendo que, se ele era tão grande e se sua ausência é tão forte, o que nos cabe fazer é lutar mais ainda, porque, se a gente não tem um Brizola hoje conosco, será preciso haver dezenas, centenas, milhares de pequenos como nós, para, juntos, tentarmos preencher o vazio que ele nos deixa.

Esta é uma oportunidade para lembrar Brizola, mas, sobretudo, para lembrar nossa responsabilidade, para continuarmos carregando as bandeiras que ele deixou.
Essas eram minhas palavras com meu carinho por ter sido brizolista e por continuar como tal hoje em dia.